O TRAUMA DO NASCIMENTO E A BUSCA POR AMPARO E ALÍVIO

Em todos os processos evolutivos que passamos ao longo da vida, nós sofremos algum tipo de ruptura ou frustração, e a primeira ruptura que vivemos é justamente o momento do nascimento. O nascimento é um dos maiores traumas humanos. Inclusive, é um dos temas mais recorrentes no universo da psicanálise.

O conceito consiste no estudo da psique do bebê enquanto feto, as circunstâncias que envolvem o seu nascimento e como essas situações gravadas na mente do bebê podem ressurgir de modo representativo no futuro. Segundo Otto Rank, psicanalista austríaco falecido em 1884, e segundo o próprio Freud, o nascimento é fonte do primeiro trauma humano, que é a separação da mãe, a expulsão do paraíso que é o útero materno. A psicanálise afirma que o nascimento nos leva ao desamparo e à angústia por toda a vida. Neste sentido, podemos dizer que nós, humanos, passamos a vida toda em busca de amparo e de alívio.

E como encontrar amparo e alívio durante a nossa vida? Acredito que cada um tenha uma resposta para essa pergunta. Afinal, cada um sabe o que te traz amparo e o que te traz alívio no decorrer da jornada. Até o momento da iniciação, nós nos encontramos, de certo modo, num estado de espírito que julgamos estar sob nosso controle. Não estou me referindo a um momento de vida perfeito, mas sim a um “mundo” que já conhecemos. Em outras palavras, estamos habituados ao nosso mundo profano e sem nenhum preparo para as provas que virão a seguir.

Da entrada na masmorra até o momento em que a cegueira chega ao fim, já dentro do templo, o que passamos pode ser resumido, da maneira mais simples possível, como uma forma de renascimento. Um caminho difícil, cheio de percalços, de surpresas mas que nos tira da escuridão e nos leva à luz. Todos nós tivemos a chance de nascer de novo através da iniciação. Mais que isso, tivemos a chance de renascer com o mínimo de maturidade e um pouco mais de preparo, tendo a oportunidade única de traçar um caminho menos tortuoso e menos doloroso em busca de amparo e alívio.

Não creio que o caminho seja mais fácil ou menos árduo que o caminho dos demais humanos que não tiveram, por assim dizer, a oportunidade de renascimento que tivemos como maçons. Pelo contrário, entendo que aqui, entre irmãos maçons, nos foi dado um desafio a mais e, consequentemente, uma responsabilidade maior em nossa busca.

Nós temos acesso a ferramentas que auxiliam a compreensão do mundo e uma rede de assistência e estudo que enriquece o conhecimento e ajuda a enfrentar essa busca com mais sabedoria. Todos nós morremos para renascer e é importante mantermos a simbologia do renascimento acesa em nosso peito e vívida em nossa alma. Não só na iniciação, mas a
cada desafio na vida, a cada novo nascer do sol, quando nos é dada a oportunidade de começar de novo, de ser melhor do que fomos no dia anterior. É justo dizer então, que esse renascimento já seja parte do amparo e do alívio que todos os humanos buscam.

Valorosos irmãos, temos uma oportunidade imperdível de avançarmos em nossa busca humana com uma vantagem que poucos têm. Dentro da nossa fraternidade temos amparo em cada ombro irmão e temos o alívio que o nosso templo proporciona. Essa combinação de amparo e alívio pode fazer com que a nossa busca humana seja mais leve e mais enriquecedora. Basta que tenhamos o coração sensível ao bem e o espírito elevado e consciente da nova vida que estamos desfrutando juntos. Que sejamos amparo um para o outro e que nosso templo seja alívio para todos nós!

Logo depois da minha iniciação, escrevi um poema breve sobre as impressões que tive e ficaram em minha memória:

Quando me libertaram da cegueira
depois de ter enfrentado o mundo
em duras provas,
me vi despido
vulnerável como um fruto maduro
acossado numa árvore
pelos pássaros mais famintos
após crivar meus pés nas pedras
na caminhada de quilômetros
após provar do mais doce e do mais amargo
após aceitar, ainda que na dor
o que me era destinado
me encontro aqui
com a alma nua
pronta para a reconstrução
me vi prisioneiro sem algemas

de uma nova realidade
de um novo tempo
de novos desafios
membro de uma família
sem laços de sangue
mas unida por um compromisso
que me foi generosamente ofertado
e humildemente aceito.

 

Aldo JR., A.’.M.’.
ARLS 3 Colinas, no Oriente de Franca, estado de São Paulo / Brasil