O QUE É A MAÇONARIA?

Nos últimos anos, com a intensificação da comunicação e compartilhamento de textos na internet, em revistas e programas de televisão, o interesse da comunidade pelos assuntos da Maçonaria aumentou. Frequentemente, pessoas não pertencentes à Ordem desejam saber mais sobre a mesma e leem alguns livros, pesquisam em sites especializados, assistem a reportagens do Discovery, National Geographic e History Channel, sem obterem uma resposta satisfatória sobre o que é a Maçonaria e qual a sua finalidade. Isso me faz lembrar o “eterno dilema das definições” e aquele fato jocoso – repetido mil por articulistas (sem citarem a fonte) – sobre a pergunta feita ao professor de Filosofia, Jules Lachelier. A narrativa tem origem na introdução do Curso Moderno de Filosofia de Denis Huisman e André Vergez: por ocasião de sua aula inaugural em Toulouse, ao ser perguntado sobre “o que é a Filosofia”, Jules Lachelier, para estupefação dos seus alunos, respondeu com apenas duas palavras: “não sei”.

Huisman e Vergez contam que toda a cidade de Toulouse zombou do brilhante professor vindo de Paris, que nem sequer sabia o que era a disciplina que estava encarregado de ensinar. Entretanto, a resposta de Lachelier teve um sentido profundo, ou seja – a Filosofia não é matéria de conhecimento. Noutras disciplinas existe algo para ser ministrado de modo racional – seja numa sequência lógica de proposições e teoremas (como no caso da Matemática) ou no conjunto de fatos e fenômenos físicos e biológicos. Mas, a Filosofia requer do pensador uma maneira própria de ver e tentar explicar a realidade, isto é: uma orientação cognitiva (visão de mundo) que abranja seus valores existenciais e normativos, suas emoções e sua ética.

Caso semelhante se dá com a Maçonaria que também não obteve, até os dias de hoje, uma definição unânime por parte das inteligências mais privilegiadas da humanidade. Se alguém, não iniciado em nossos mistérios, perguntasse “o que é Maçonaria?”, nem os mais destacados iniciados de nossa Ordem assumiriam a responsabilidade de defini-la. Para a estupefação de nossos interlocutores, seríamos obrigados a responder apenas com aquelas palavras mágicas de Lachelier: “não sei”.

Só os detratores da Maçonaria têm definições preparadas, na ponta da língua, como ferramenta ou arma de ocasião, do tipo “cento e quarenta e três respostas sobre tudo o que você sempre quis saber sobre maçonaria mas tinha vergonha de perguntar”.

Nós maçons não pretendemos responder ao universo de perguntas sobre nossa Ordem porque somos eternos questionadores dos fatos sociais, filosóficos e culturais que interessam ao bem-estar da humanidade. Nossa Ordem é dinâmica e, apesar das leis centenárias que a regem, muda constantemente de acordo com a evolução do pensamento humano e seus anseios mais íntimos.

Por isso um candidato à iniciação Maçônica nada pode saber sobre nossa Ordem. Apenas espera-se que ele venha a descobrir alguma coisa ao percorrer os graus aos quais tiver acesso durante sua vida na organização. Os dicionários, as enciclopédias, os sites da internet, livros e programas de televisão, somente darão a entender, sem clareza, que Maçonaria é “uma sociedade cujo objetivo principal é desenvolver o relacionamento fraterno, a filantropia e outras particularidades de que somente os maçons têm conhecimento”. Por esta e muitas outras razões, pode-se dizer que a Maçonaria é apenas semelhante a uma escola no sentido comum da palavra.

O estudo da origem e evolução da palavra Maçonaria nos remete ao ofício de alvanel (aquele que trabalha com pedra – “mason” em inglês ou “maçon” em francês, cujo significado é pedreiro). Esta explicação, apesar de fornecer uma ideia do nosso simbolismo e da atividade de construtores à qual nos empenhamos, não define “o que é a Maçonaria”, mas fornece uma analogia entre alguns de nossos métodos especulativos com o ofício operativo de quem lavra a pedra irregular para assentá-la à regularidade de uma construção. A pedra é o homem; a construção é a sociedade.

O simbolismo é parte desse sistema que consiste na prática de lançar juntas (syn+bálein) duas coisas que, por analogia ou relação de semelhança, despertam a compreensão de outra realidade: “pedra-homem”; “edifício-sociedade”.

Este aspecto da “técnica” maçônica – progredindo do senso comum para o senso crítico – distingue nossa atividade da especulação religiosa e do sectarismo político. A nenhum maçom, todavia, é imposto abandonar suas convicções religiosas nem abandonar o ideário político que tenha abraçado. Todavia, aprendemos a nos deslocar do senso comum (o conhecimento mediano compartilhado pela maioria das pessoas) para uma expansão possível da consciência que a iniciação nos propicia. Se durante esse processo abandonarmos alguma coisa, essas serão as noções facciosas, os preconceitos, os delírios fantasiosos e o raciocínio falacioso. Obrigamo-nos, mediante o senso crítico, a contestar todo movimento ou intenção que simule a veracidade.

– Mas as religiões, as universidades e as demais ordens iniciáticas não fazem o mesmo?
– SIM, realmente o fazem. Contudo a Maçonaria não obriga nem avalia seus membros quanto ao nível de senso crítico alcançado; não impõe fórmulas dogmática nem induz seus participantes a acreditarem em coisas que não possam ser demonstradas ou comprovadas. Não incentiva delírios ou imaginações exacerbadas deixando que cada um distinga, por si mesmo e a seu tempo, o falso do verdadeiro. Coroando tudo isso – e aqui reside sua marca histórica e fundamental – a Maçonaria se rege pelo amplo sistema participativo, libertário e democrático; em nossas fileiras prevalece sempre o contraditório e a eleição universal de seus dirigentes.

CONCLUSÃO: A figura do Rei Salomão no simbolismo maçônico ilustra o senso crítico como estágio superior do poder e realeza. Diz a Bíblia que Deus apareceu a Salomão em sonhos, dizendo-lhe: – Pede o que queres que eu te dê. E Salomão respondeu: – Sou apenas um menino pequeno; não sei como sair, nem como entrar; dai, pois, ao vosso servo um coração entendido para julgar, para que prudentemente eu possa discernir entre bem e mal. E disse Deus: – Porquanto pediste discernimento e o que é justo, e não suplicaste para ti muitos dias de vida, nem riquezas, nem a morte de teus inimigos, eis que faço segundo tuas palavras: dou-te um coração sábio e discernimento.

O diálogo entre a divindade e o rei – Arte Real – expressa a aspiração ao senso crítico e a conquista da “técnica” que o iniciado realiza dentro de si e sobre as ideias que recebe do mundo, produzindo ideias novas e superiores que a simples realidade não pode fornecer. Isto, apesar de não definir, é a Maçonaria.

 

José Maurício Guimarães, M.’.M.’.
(Texto adaptado do seu artigo publicado na Revista Triângulo, da Grande Loja Maçônica de Minas Gerais – Brasil)