OS MISTÉRIOS

“(…) JAMAIS REVELAR ALGUM MISTÉRIO, SEGREDO OU SÍMBOLO DA MAÇONARIA, POR QUALQUER FORMA QUE SEJA A QUALQUER HOMEM QUE EU NÃO RECONHEÇA COMO VERDADEIRO E FIEL MAÇON. (…) SE EU FALTAR A ESTE COMPROMISSO QUE ACABO DE ASSUMIR DE LIVRE VONTADE E FIRME DETERMINAÇÃO, CONSINTO EM SER CHAMADO DE HOMEM SEM FÉ, SEM HONRA E DIGNO DE DESPREZO DE TODOS OS HOMENS.”
In  Ritual do Grau de Aprendiz   Rito Escocês Rectificado

Para esta primeira apresentação por escrito, junto dos meus Ir.’. e em Loja, escolhi um tema que me é grato e contudo parece-me que tem estado envolto em alguma polémica, o segredo da e na Maçonaria. Como titulo desta prancha, de aprendiz, escolhi uma simples frase de Fernando Pessoa que identifica sublimemente o que sinto no intimo do meu coração e acima de tudo no pensamento que me ajuda ou deverá ajudar a alicerçar a construção do Templo Interior que creio e ouso tentar construir com a ajuda do G.’. A.’. D.’. U.’. e de todos os meus Ir.’. Maçons.

Mas mesmo antes de iniciar a dissertação opinativa sobre o segredo da e na Maçonaria, temos de  viajar , todos nós, um pouco atrás no processo de Iniciação Maçónica. Esta decorre por fases, sob a forma de provas que exprimem, no fundo, a necessidade de um profano ultrapassar os  medos  de chegar ao conhecimento o qual sendo alcançado irá tornar estes  medos  iniciais, do profano, em impossíveis. As provas iniciáticas são assim ritos preparatórios da iniciação e tomam normalmente a forma de  viagens  simbólicas que conduzem o Ser das Trevas para a Luz, purificando-o no decorrer de cada jornada simbólica. Contudo nestas ditas  viagens  podemos encontrar, quem assim o buscar com firmeza, uma espécie de recapitulação dos estados precedentes, através da qual as possibilidades do estado profano são esgotadas, afim de que a partir de então, o Ser possa desenvolver livremente as possibilidades de ordem superior que traz em si. Desta forma podemos dividir a Iniciação em duas fases principais, apresentadas como distintas mas fundamentalmente complementares, os  Pequenos  e os  Grandes Mistérios  ou melhor dizendo, os  Mistérios Menores  e os   Mistérios Maiores.

Numa rápida e muito sucinta explicação de ambos, os  Mistérios Menores  são aqueles que dizem respeito ao  Paraíso Terrestre  e que têm como fim primeiro restaurar o  estado primordial , o dito  homem verdadeiro . Compreendem estes mistérios tudo o que se relaciona com o desenvolvimento das possibilidades do  estado humano  e têm como uma conclusão primordial a realização  horizontal , atingindo-se esta através do denominado  segundo nascimento , vivendo este como que uma autêntica regeneração psíquica que permite o conhecimento do devir por parte do então profano agora já A.’.Maçon. Quanto aos  Mistérios Maiores  (que este A.’.não tem ainda idade suficiente para discutir ou apresentar, fica para altura própria), estes dizem respeito à realização dita  vertical , dos  estados supra-humanos , conduzindo o Ser do  estado primordial  à  libertação final , à  Identidade Suprema .

E é aqui que chegamos ao Mistério. Aliás existem vários e a saber ao longo de toda a vida de Maçon sendo preciso encontrá-los nesta contínua busca da verdade e quiçá, em boa verdade, em busca da Luz. Mas será sobre o íntimo da palavra e só desta que vou agora incidir.

MISTÉRIO

 Mistério  é uma palavra de origem grega que, no seu sentido original, se liga directamente com a ideia expressa de  silêncio , designado o inexprimível. Assim podemos apresentar o sentido que lhe queremos dar em três vertentes ou sentidos imediatos. Temos que num primeiro sentido mais imediato e exterior, o Mistério é aquilo de que se não deve falar, sobre o qual convém guardar silêncio ou que é proibido fazer conhecer no exterior. Num segundo sentido, talvez este não tão imediato, o Mistério designa o que se deve receber em silêncio e guardar no íntimo de cada um que o recebe. E finalmente, num terceiro sentido, muito mais profundo, é o inexprimível, o que se pode apenas contemplar em silêncio, dito por outras palavras, algo impossível de exprimir por palavras por quem a ele tem acesso.

Será neste momento que fará todo o sentido recordar aqui Evola que na sua obra  La Tradizione Hermetica , revela que o segredo iniciático não está «ligado a um exclusivismo sectário ou a um não quer dizer, mas antes a um não poder dizer, além do dever de se evitar que a inevitável incompreensão do profano vá alterar ou profanar o ensinamento.» Com este pequeno mas conciso excerto podemos pegar nele e aplica-lo perfeitamente à célebre questão do segredo maçónico sobre a qual me proponho explicar as minhas ideias.

[topo]

Que aquele que tem ouvidos os abra e oiça; que aquele que tem boca a mantenha fechada.
In  Turba Philosopharum

A lei do silêncio sempre foi respeitada pelos Maçons tradicionais mas o que estava em causa fundamentalmente na Maçonaria não era apenas a sua qualidade de  sociedade secreta  mas sim o facto de o segredo se encontrar intimamente ligado com a transmissão da Iniciação de Mestre para o Aprendiz e nada mais. Tudo o que se ligava com a técnica  operativa  e com o segredo da Ordem não podia nem devia ser exposto livremente em rituais impressos pois fazia parte da transmissão iniciática de uma forma pratica e por via oral. E este silêncio que se impunha aos iniciados (Aprendizes), e que tem razões bem mais importantes do que a simples prudência, nunca se impôs tão fortemente como nas condições actuais pois hoje em dia, e devido a questões de politica, de alguma falta de rigor da aceitação de candidatos a Maçon, bem como na vaidade de alguns conhecedores do segredo, quer-se expor de forma ignóbil o segredo iniciático aos ideais políticos e sociais de liberdade e igualdade de uma sociedade tida como aberta mas extremamente carecida de valores de referencia como por exemplo, a fé, a lealdade e a fraternidade.

Mas meus Ir.’., o verdadeiro segredo iniciático é apenas o  incomunicável  e só a Iniciação pode dar acesso ao seu conhecimento. O segredo dito exterior será sempre um elemento secundário e acidental, e o seu valor é somente de símbolo em relação ao autêntico segredo que é interior. Assim sendo, e tomando como referencia que se a organização iniciática é tida como  secreta , este secretismo não resulta de algo artificial ou arbitrário mas sim porque a organização fecha-se sobre si própria contra a degenerescência. O segredo é de tal natureza que as palavras não o podem exprimir, é inacessível e inatingível e onde só os ritos e os símbolos o podem, quando muito, sugerir.

Desta forma sinto pessoalmente que o que hoje em dia se vai constatando é que cada vez mais a Maçonaria se abre ao mundo profano, como exemplo a exposição mediática televisiva, na imprensa escrita e bem como na Internet dos nossos símbolos e de algumas ideias (felizmente poucas), dando a conhecer o que de mais íntimo e secreto existe nesta organização e como tal degenerando a sua essência de ordem iniciática secreta. Ora desta forma, temos de saber o que se quer:
– ou mantemos a tradicional forma de estar e agir invertendo o caminho necessariamente para continuar como uma organização secreta com os seus valores;
– ou abrimos a porta deste segredo e damo-nos a conhecer ao mundo profano de tal forma que se irá destruir tudo o que se veio até agora a conquistar.

Eu, pela minha parte, opto pelo primeiro caminho. Salvaguardar o segredo maçónico é primordial pois só com ele se pode construir o Templo Interior que todos ambicionamos pois para todos nós o valor maior é aquele que é apreendido, descoberto e desenvolvido no interior da cada um colocando assim a inteligência no lugar da memória. E em conclusão algo que ilustra muito profundamente o pensamento deste vosso I.’.nos dias que correm.

Aqueles que decidem ser Maçons apenas para chegarem a conhecer o segredo podem desiludir-se, pois podem viver cinquenta anos como Mestres Maçons sem jamais conseguirem penetrar o segredo. O segredo da Maçonaria é inviolável pela sua própria natureza, dado que o Maçon que o conhece conhece-o apenas por tê-lo adivinhado. Não o aprendeu de ninguém. Descobriu-o por ter frequentado a Loja, observado, raciocinado e deduzido. Quando o atinge, evita participar a sua descoberta a quem quer que seja, mesmo ao seu melhor amigo Maçon, pois se este não teve o talento para penetrar também não terá o de o aproveitar depois de o conhecer oralmente. Esse segredo será sempre portanto, sempre um segredo. Assim, tudo o que se faz na Loja deve ser secreto, mas aqueles que, por uma indiscrição desonesta, não tiverem escrúpulos de revelar o que nela foi feito, não revelam o essencial. Como poderiam eles revelá-lo se nada sabem? Se o soubessem, não falariam das cerimónias.

Disse!.

Fernando C.’.,
A.’.M.’., R.’.L.’. Fernando Pessoa,  G.·.L.·.R.·.P.·..