Preocupa-nos nossa particular insegurança quanto aos governos constituídos, aos grupos liberais desesperadamente envolvidos no “enriquecimento imediato”, aos nossos semelhantes despojados da mais simples dignidade e fé, da insegurança da vida, do patrimônio, da família, do bem-estar, da felicidade, do amor.
Temos visto dados comparativos que tentam associar crise econômica e aumento da criminalidade, onde dados estatísticos sugerem teorias para explicar (ou justificar) as dificuldades que hoje enfrentamos com o aumento da violência e criminalidade no seu sentido mais amplo.
Os fatores desencadeantes desse processo crescente incontrolável são evidentemente vários, mas podem ser detectados por uma análise cuidadosa isenta de paixões. Cada um de nós deve analisar do seu ponto-de-vista, sob o enfoque de sua formação e experiência, e principalmente com seu grau de envolvimento afetivo com os problemas sociais.
A grande massa está preocupada com sua própria sobrevivência, em satisfazer a forte tendência consumista, em galgar um patamar de “status” (1) sempre mais elevado, em aparentar-se mais importante do que o próximo, em resumo, se auto-valorizar porque ainda não se encontrou e talvez nem saiba o que quer! Todos os seres têm um talento, uma tendência, e estruturam mediante informações, perspectivas para sua vida. Muitas vezes (e infelizmente) são dirigidos (2) com grande sutileza para atividades que não refletem nem ocasionam “no fundo de sua alma” uma satisfação, uma felicidade interior.
Todos nós já observamos que está havendo uma perturbação no comportamento humano com efeitos -por nós sentido e por vezes vivenciado- que estão comprometendo nosso equilíbrio social.
Toda nossa tentativa de querer classificar sentimentos (amor, ódio, infidelidade, desconfiança, inveja…) em bons ou maus neste período conturbado, redunda em fracasso, pois são componentes de um sistema que funciona como um todo correspondendo a estados naturalmente adquiridos.
Na realidade, temos -hoje- em excesso a desconfiança, o ódio, a inveja, a infidelidade, a violência, a vaidade, a crítica, faltando-nos amor, o respeito, a fraternidade e tantas outras virtudes que desejarmos. Todo excesso é prejudicial ao grupo e individualmente. Simplesmente perdemos a ação reguladora e ficamos sujeitos a um equilíbrio instável e artificial.
O comportamento humano parece ter se desenvolvido como função de um sistema que deve sua existência e forma específica a um processo histórico que teve seu desenvolvimento nas diversas culturas e épocas.
Vivemos uma perigosa perturbação de convivência individual, de grupo, de relações estruturais de governos, instituições e ordens, onde os mecanismos reguladores do comportamento inexistem ou se tornaram ineficazes. Todos lutam tenazmente por seus direitos individuais ou de grupos, perdendo-se num emaranhado de retórica estreita e improdutiva distanciando-se da noção do todo e das Tradições (3).
O ser humano alcançou considerável grau tecnológico aprendendo a dominar todos os poderes do seu meio estranhos a sua espécie, porém, sabe ainda muito pouco sobre si mesmo. O homem determina seu próprio desenvolvimento, compete com ele mesmo, aniquilando com incrível brutalidade todos os valores que ele como ser humano criou através das civilizações, em nome de considerações puramente econômicas e de desenvolvimento em detrimento de quaisquer valores reais. Estamos culturalmente “doentes”.
“O que é bom e útil para a humanidade como um todo, ou mesmo para o homem isolado, já foi completamente esquecido devido à pressão dessa competição furiosa. Os valores apreciados pelo homem contemporâneo são aqueles que levam ao sucesso e à superação do próximo.” (Konrad Lorenz)
Não estamos abandonados, apenas nos abandonamos! Todo esse desencadeamento de comportamento egoísta (anti-social, inescrupuloso, rebelde, criminoso, falso…) isto é, “cada-um-para-si” a qualquer custo, mostra o quanto nos afasta daqueles princípios e virtudes que tentam manter o Homem no caminho de seu destino (cada vez melhor) de evolução.
Todas as agressões físicas e morais -diretas ou não- nos têm conduzido a sentir medo e acabamos alimentando uma ansiedade desmedida somatizando e produzindo reações de enfraquecimento e inibição que nos impede de analisar os fatos com clareza.
Os “direitos humanos” têm se evidenciado de tal forma que hoje, nesta triste situação crítica, vemos sua ação tão enaltecida que tem sido objeto de controvérsias, pois sua força como objeto de defesa está sendo direcionado –aparentemente- para os que burlam as normas em detrimento daqueles que são vítimas de abusos.
Nossa vida tornou-se difícil e perigosa, somos penalizados por uma economia incerta e insegura, gerando um estado de alerta e medo. Toda prática considerada “criminosa” ou desprezível no passado, hoje são atividades de sobrevivência caminhando para prática comum e necessária de uma parcela de nossos semelhantes. Essa parcela está perigosa, impulsiva e indisciplinada, não aparentando temor a nada. Estamos tão ameaçados que agimos com uma prudência tão extremada que está nos levando ao limite da covardia!
Nos centros mais populosos, indiretamente a superpopulação nos leva a fenômenos de desumanização pelo esgotamento das relações, desencadeando todos esses comportamentos agressivos imediatos. A falta de amabilidade generalizada é diretamente proporcional à densidade das massas humanas acumuladas, e é causadora de inconveniências de relacionamentos com manifestações hostis por vezes violentas e truculentas.
Obviamente, nossos padrões para uma vida em sociedade estão sendo alterados, ou já foi alterado. Se formos incapazes de lidar com os problemas de comportamento hoje, o que nos espera no futuro? O grupo encarregado de preparar o ser humano para uma vida em sociedade -a família- está em colapso, a instituição com o dever de formar o cidadão e fortalecer os laços morais -a escola- faliu e tenta reequilibrar-se em bases duvidosas.
Aonde buscar a solução? Ou será melhor fazê-la?
Acreditamos que é necessário repensar a Educação, nela residem todos os problemas e todas as soluções. O processo civilizatório (nossa evolução como espécie) exige uma tomada de consciência, a responsabilidade pelo próprio destino, um alto poder de decisão e níveis operacionais cada vez mais sofisticados. A escola preocupa-se em formar o técnico, baseado na necessidade de recursos humanos necessários, jogando-se o ser humano como um objeto atuando como um processo de “linha de produção” de profissionais necessários.
O Homem é um ser em trânsito, não é uma realidade acabada. Educar não é reproduzir um modelo, é fazer um novo Homem na progressão genética de seu destino evolutivo. (Lauro O. Lima)
O direito á Educação não é o direito de matricular-se numa escola, é o direito de desenvolver-se até o limite das possibilidades de ser racional. (Lauro O. Lima)
A expressão “preparar para a vida” que a escola sempre carregou, está fatigada, pois, não há uma vida previsível para a qual se possa preparar alguém; a todo o momento estamos nos transformando, nos auto-regulando. Somos membros da família humana. Precisamos dar um sentido de direção (aonde queremos chegar), propósito (o que queremos) e elevação (existir não é só passar pela vida) à nossa comunidade. Precisamos expandir as consciências.
À medida que nos conhecermos melhor -”Conheça-te a Ti mesmo”- poderemos sentir a fraternidade, usufruir do convívio, compreender as dificuldades individuais, afastar a intolerância trabalhando as consciências, amar ao próximo. É fazendo ações nobres, e não apenas determinando que sejam feitas, que os frutos da ação meritória são colhidos.
Nenhum esforço é perdido, cada causa produz necessariamente seus efeitos.
Para nossa reflexão transcrevemos uma história Zen:
“Certo e Errado” – Quando Bankei realizava semanas de retiro de meditação, estudantes de muitas partes do Japão compareciam. Durante um desses encontros um estudante foi pego roubando. O assunto foi relatado a Bankei com a solicitação de que o estudante fosse expulso. Bankei ignorou o caso. Mais tarde o estudante foi pego em um ato semelhante, e mais uma vez Bankei desconsiderou a questão. Isso irritou os outros estudantes, que redigiram uma petição pedindo o afastamento do ladrão, afirmando que caso contrário eles iriam embora em grupo. Quando Bankei leu a petição, convocou todos para comparecer a sua presença. “Vocês são irmãos sábios”, ele lhes disse. “Vocês sabem o que é certo e o que não é certo. Vocês podem ir para algum outro lugar estudar se quiserem, mas este pobre irmão não sabe nem mesmo distinguir o certo do errado. Quem lhe ensinará se eu não o fizer? Vou mantê-lo aqui, mesmo que todos vocês partam”. Uma torrente de lágrimas limpou o rosto do irmão que tinha roubado. Todo o desejo de roubar havia desaparecido.
José Eduardo Stamato, M.’.I.’.
ARLS Horus nº 3811 – GOSP – GOB, Brasil
Notas:
Status – conjunto de direitos e deveres que caracterizam a posição de uma pessoa em suas relações com outras. O status social de um indivíduo é a soma dos status parciais que desfruta em cada grupo de que participa.
Essa direção (hoje) sempre é sugerida pelo trabalho da mídia através das entrevistas, bate-papos, novelas, reportagens e principalmente pela família que querendo o melhor para seus descendentes podem levá-lo a escolher erradamente.
Tradição – repositório de conhecimento e sabedoria acumulado através das épocas pela dinâmica inerente do ser humano visando a perfeição.
Referências Bibliográficas:
Trabalho – “A criança e o Professor” – Ir J.E. Stamato
Anotações pessoais sobre Educação.
Histórias Zen – Paul Reps – Ed. Teosófica
Os Oito Pecados Mortais do Homem Civilizado – Konrad Lorenz – Ed. Brasiliense
Psicologia da Inteligência – Jean Piaget – Ed. Fundo de Cultura
Seis Estudos de Psicologia – Jean Piaget – Ed. Forense